quinta-feira, 16 de agosto de 2007


- Descartamos então o Champs-Elysée? – Mad fez um risco na prancheta
- Sim, o bairro é muito caro! – Bel fez uma careta – Quais as outras opções?
- Bom, temos que olhar ainda alguns que falei com o proprietário aqui em Tuileries, e tem dois em Beaubourg – Marie falou consultando o relógio – Vamos logo, os bairros são distantes um do outro. O próximo prédio fica na Rue Vignon, do outro lado.

Estávamos parados no Bairro da Ópera, sentados na calçada bem em frente à Ópera Garnier. Dominique e eu brincávamos de espantar os pombos na praça quando vimos as meninas e Bernard levantarem e começarem a caminhar. Era nosso quarto dia andando de cima a baixo em Paris à procura de um apartamento onde Dominique, Bernard e eu pudéssemos morar. E as meninas assumiram todo o controle da situação, alegando que se dependesse de nós, moraríamos debaixo da Pont Neuf.

Levamos cerca de dez minutos para atravessar a Boulevard de La Madeleine e chegar ao prédio. Mas nem bem entramos e Bel e Marie torceram o nariz: as paredes estavam descascando. Antes mesmo que o proprietário terminasse o tour pelo local, elas já haviam decidido que aquele estava descartado também. De lá fomos caminhando até uma rua às margens do Rio Sena. Esse não tinha nenhum defeito aparente, estava em perfeito estado. Bem, doce engano. Descobrimos naquele momento que nós três, os que iriam morar no apartamento, éramos meros figurantes naquela busca. Quem estava ditando as regras e critérios de escolhas eram Marie, Mad e Bel. E o defeito desse era a movimentação dos barcos que faziam muito barulho à noite.

- Mas quem vai dormir aqui? – falei frustrado. Tinha gostado do lugar – Nós, ou vocês?
- Se quer que eu passe alguma noite com você, é bom que seja silencioso na rua – Marie respondeu irritada quando a buzina de um barco apitou bem perto de onde estávamos
- Bem, com um argumento desses... – falei cínico e ela me olhou séria – Aonde vamos agora?
- Rue de Turenne, perto da Place des Vosges – Bel respondeu olhando no cronograma

Tornamos a caminhar pelas ruas e já começava a me cansar. Não podia imaginar que procurar apartamento era tão estressante. Tinha a impressão de que já havíamos percorrido toda Paris a pé, e até agora não havíamos encontrado nada satisfatório. Estava sendo forçado a admitir que sem a ajuda das meninas, teríamos alugado o primeiro que vimos, por pior que ele fosse. Só pelo simples fato de evitar toda essa romaria.

O apartamento da Rue de Turenne também era uma desgraça. Esse até mesmo Dominique, que era o mais desligado do grupo, bateu o pé dizendo que não havia gostado. Passamos por mais meia dúzia de prédios antigos e com preços absurdos, até que Mad pareceu ter encontrado algo no jornal trouxa. Segundo o anúncio, o apartamento era de frente para a Boulevard St-Germain, com entrada na Rue de Seine. Já me animei mais, pois a Boulevard St-Germain era onde tinha a maior concentração de bares e cafés descolados. Dessa vez pegamos o metrô para chegarmos lá, já com os pés doendo às 16h.

O prédio era mais uma das construções antigas que eram padrão em Paris, mas a fachada estava bem cuidada e a rua era a mais tranqüila possível. As meninas logo sorriram, o que era um sinal muito bom. O proprietário, um senhor já de idade chamado René Assouline, nos recebeu muito gentil e começou um animado tour pelo local. Era um apartamento de três quartos, o que era perfeito para que cada um tivesse o seu espaço, dois banheiros sendo um deles um lavabo, uma cozinha um pouco pequena, mas ótima para três pessoas que sabem apenas abrir o pacote de biscoito, um sala espaçosa e um balcão que tinha vista para a Boulevard St-Germain. E a melhor parte, o preço estava razoavelmente bom. Olhava animado para o apartamento e percebi que Bernard e Dominique também pareciam ter gostado. Quando vi que as meninas também sorriam, respirei aliviado. Tínhamos encontrado nosso canto.

- Bom, adoramos seu apartamento – Marie estendeu a mão para o senhor – Vamos ficar com ele!
- Excelente! – o homem falou bastante animado – E a vizinhança é perfeita para jovens como vocês, tem muitos bares por aqui
- Sim, já localizamos alguns deles – Dominique respondeu do balcão – Dá para ver o Les Deux Magots daqui!
- E estamos perto de onde vamos estudar, não é, Marie? – Mad foi até o balcão com Dominique – A Escola Superior de Belas Artes fica há 4 quadras daqui!
- E o Louvre também é perto! – Bel constatou empolgada – Vocês gastariam menos de quinze minutos caminhando daqui até lá
- É o lugar perfeito, pois também não é longe de onde vamos trabalhar! – falei animado
- Acho que agradou a todos – o senhor tornou a falar, rindo – Venham então, vou lhes mostrar as instalações do prédio!

O Sr. Assouline abriu a porta indicando o corredor com a cabeça, e o seguimos. Levamos meia hora para percorrer todos os corredores e andares do prédio, mas pudemos decorar onde ficava tudo, e descobrir que possivelmente teríamos problemas com o síndico. Segundo o Sr. Assouline, o homem chamado Pascal Rousseau era um excêntrico crítico de restaurantes que odiava barulho, principalmente à noite, e tinha certa aversão a jovens. Ele os considerava demasiados barulhentos. Bom, acho que ele terá que superar e conviver com isso de agora em diante.

Passamos mais algum tempo no apartamento acertando tudo e ficou combinado que poderíamos nos mudar dentro de três semanas, quando toda a papelada já estaria pronta. Nos despedimos do senhor e paramos no café mais próximo, que ficava do outro lado da Boulevard St-Germain, para comermos alguma coisa. Os quartos precisariam de uma decoração pessoal, a sala seria entregue nas mãos das meninas para que fica apresentável e a cozinha, bem, essa duvidava muito que seria tocada, e então teríamos nosso próprio canto, nosso atestado de liberdade e independência. E é claro, depois disso tudo, teríamos que fazer o sacrifício de dar uma festa de inauguração. Pobre síndico... Será que ele vai ficar muito incomodado?

Vai ter festa lá no meu apê, pode aparecer, vai rolar bunda lelê ♪