terça-feira, 1 de abril de 2008


Um mês atrás...

- Ian, sente-se, por favor – minha mãe pediu pela 5ª vez, mas não lhe dei ouvidos
- Ela não tinha esse direito! – berrei com raiva e ela não se abalou – Não podia decidir sozinha!
- IAN! – ela berrou tão alto quanto eu e parei de andar - Senta agora nesse sofá ou vou lhe acertar um tapa! – mamãe falou ríspida e sentei assustado – Vai me deixar falar? – fiz que sim com a cabeça e ela sorriu – Bom, muito bom. Comece explicando porque tive que ir até Saint Tropez tirar você de uma delegacia trouxa, por favor...

Ela sentou ao meu lado e respirei fundo, começando a relatar o que tinha acontecido depois que descobri ter uma filha e que ela estava em um orfanato. Havia procurado o lugar e quando a senhora me informou que o bebê não estava mais lá e não podia me dar o endereço do casal que estava tentando adotá-la, perdi a cabeça. Arrumei um verdadeiro barraco na recepção exigindo saber para onde tinham mandado minha filha e a senhora chamou a policia trouxa. Cecile foi quem ligou para minha mãe, sem saber o que fazer.

- Desculpe, mas fiquei transtornado e perdi a cabeça
- Tudo bem, você sofreu um baque muito forte. Mas saiba que foi a 1ª e última vez. Aprenda a controlar isso, pois se acontecer outra vez terá que se virar sozinho. – assenti com a cabeça e ela sorriu – Então, quer dizer que sou avó?
- Não sei o que fazer, mãe. Pela primeira vez não sei qual deve ser meu próximo passo
- Não se preocupe. Estamos do seu lado e faremos de tudo para ajudá-lo a encontrá-la. Essa criança será criada na nossa família, que é o lugar dela. Mas agora a única coisa com que deve se preocupar é em contar a Marie, pois ela é sua namorada e tem o direito de saber. Vá falar com ela e deixe que eu mesma conto ao seu pai e seu avô. Amanhã, quando você estiver com a cabeça fria, vamos sentar e conversar para saber o que fazer.

Mamãe beijou minha testa e levantou, indo para o escritório e fechando a porta. Ainda fiquei alguns minutos no mesmo lugar, encarando o chão, até que levantei também e desaparatei direto para o prédio onde Marie morava. Ela ainda estava no trabalho e fiquei sentado no corredor esperando ela chegar. Tentava descobrir uma maneira de contar a ela, mas por mais que batesse a cabeça na porta, a resposta não vinha. Só conseguia visualizar Terri contando que abandonou a criança em um orfanato, e a senhora da recepção me dizendo que ela não estava mais lá.

- Luke? – ouvi a voz de Marie no corredor e abri os olhos, saltando do chão – O que está fazendo aqui? Pensei que só voltava de Saint Tropez amanhã.
- Houve um contratempo. Podemos entrar? Quero conversar com você.
- É pra ficar preocupada? Porque não vejo você tão sério desde a morte do Michel.
- Prefiro conversar lá dentro.

Marie me encarou preocupada, mas não fez mais perguntas e abriu a porta. Sentei na poltrona da sala e ela se sentou na mesa de centro, para ficar de frente para mim. Fiquei encarando ela em silêncio alguns segundos, ainda não sabia como contar, mas precisava dizer alguma coisa. Bastava um segundo de legilimência e ela descobriria tudo, e não era dessa forma que queria que ela soubesse.

- Encontrei a Terri ontem à tarde, tomamos um suco juntos no quiosque da praia – comecei e ela me interrompeu
- Por que algo me dizia que ela estava envolvida nisso? Vai me dizer o que? Que descobriu que ainda é apaixonado por ela e vão voltar? Porque se for, não perca seu tempo. Pode sair e não me faça ter que ouvir isso!
- Pare com isso, Marie. Já disse que nunca fui apaixonado por ela, só por você!
- Então qual é o problema? Por que está com essa cara de velório?
- Porque Terri estava grávida, teve um bebê há 7 meses atrás. E o pai desse bebê sou eu.

Depois de soltar tudo de uma vez, esperei que Marie falasse alguma coisa. Mas ela não falou. Ficou me encarando sem reação, e aquilo foi pior do que imaginava. Queria que ela dissesse qualquer coisa, até mesmo que me xingasse ou me batesse, mas aquele silêncio estava me matando.

- Não vai dizer nada? – arrisquei depois de alguns minutos

Ela então levantou ainda em silêncio, caminhou até a porta e a abriu. Depois me encarou novamente muito séria, como nunca havia visto antes. Era impossível dizer o que se passava na cabeça dela.

- Vai embora, por favor. – disse enfim, segurando a porta aberta
- Marie, por favor, não faz isso
- Vai embora, Ian. Quero ficar sozinha.
- Marie, eu não sabia! Quando ela engravidou ainda éramos namorados, eu não trai você! Nunca faria isso!
- Ian, agora não! Vai embora, por favor.

Ainda tentei argumentar, mas ela não disse mais nada e não vi outra alternativa que não fosse fazer o que me pedia. Sai do apartamento de cabeça baixa e fui direto para casa. Ainda precisava contar ao Bernard, e ao menos ele eu tinha certeza que não me deixaria sozinho.

ººº

Entrei no café escolhido por Viera e logo o avistei sentado em uma das mesas de fundo, lendo o jornal ainda de óculos escuros e com uma xícara de café em cima da mesa. Quando me aproximei e puxei uma cadeira vazia da mesa ao lado, ele abaixou o jornal e sorriu, tirando os óculos. Tinha os olhos vermelhos e uma cara abatida.

- Você ta um lixo – falei tentando não rir
- Manu não me deixa dormir... – respondeu rouco e não segurei a risada – E a Marie? Algum avanço?
- Nada, ela ainda não quer falar comigo – disse desanimado – Estou dando o espaço que ela pediu, não quero forçar nada. Mas está difícil sem ela...
- Fica tranqüilo, ela só precisa digerir tudo que aconteceu. Não é algo que se pede todo dia...
- É, eu sei, e espero que ela entenda um dia – sacudi a cabeça espantando o pensamento e olhei para ele rindo – Mas você realmente está um lixo, cara!
- Bom, não é só Manu que me deixa assim. Você também tem uma parcela de culpa.
- Ih sai pra lá! Gosto muito de você, mas meu negócio é mulher!
- Por mais boa pinta que você seja, também prefiro mulher – Viera riu e abriu a pasta, puxando um envelope e me entregando – Consegui isso ontem, por isso te liguei marcando hoje aqui.

Abri o envelope e tirei um bolo de fotografias. Eram todas de um bebê loirinho e de olhos azuis com um casal dentro de casa. Ela era linda. Não consegui conter o sorriso enquanto ia passando as fotos, e demorei mais na última. Ela sorria, e era igual a mim.

- O nome dela é Gabriela – Viera falou me fazendo sair do transe – O casal que está com ela na foto são Regina e Pascal Prevost, e eles ainda não têm a guarda definitiva dela, estão sob observação do juizado de menores.
- Então tenho chance de conseguir a guarda dela?
- Eles tem muitos pontos a favor deles que você não tem, mas você tem o trunfo principal. Você é o pai dela, e isso vai pesar bastante. Não vai ser nada fácil, meu amigo. Mas tenho certeza que vamos sair vitoriosos nessa batalha.

Viera bateu no meu ombro sorrindo e voltei a encarar as fotos na minha mão. Faria o que fosse preciso, mas ia ter minha filha comigo.